sexta-feira, 3 de junho de 2011

Lenda de S. Pedro de Rates

S. Pedro de Rates - Entre a Lenda e a Tradição
Conta a tradição que S. Pedro de Rates foi convertido ao Cristianismo pelo Apóstolo S. Tiago, aquando da sua peregrinação pela Hispânica, no século I. Durante essa viagem, cumprindo a missão de difundir a mensagem de Cristo, morto e ressuscitado havia pouco tempo, foi deixando sementes que germinaram e fortaleceram as raízes da Igreja Católica Apostólica Romana, num império hostil à nova Fé. Pedro seria um dos 7 varões ordenados pelo Apóstolo, em Santiago de Compostela, e nomeado bispo de Braga.



Na lenda, o episódio que fez dele um mártir teve origem num milagre: solicitado para curar de doença fatal a filha de um poderoso pagão, S. Pedro de Rates conseguiu-lhe tal dádiva. Reconhecida, converteu-se ao Cristianismo, o que causou a ira do pai e consequente desejo de vingança. Avisado, o Santo refugiou-se em Rates, mas foi aí encontrado e assassinado. Ficou sepultado sob as ruínas da pequena capela onde tudo aconteceu, pois, à semelhança da vida do religioso, também foi destruída.



Tempos mais tarde, do alto do monte onde se refugiara, o eremita S. Félix vislumbrava uma luz na escuridão. Guiado pela curiosidade e pela convicção de um chamamento piedoso. Dirigiu-se ao local, procedeu à remoção das pedras e encontrou a causa de tal clarão: o corpo de S. Pedro de Rates.

A transladação do corpo intacto para a Sé de Braga faz, também, parte da lenda. Os factores reportam-se somente à transferência, no século XVI, pelo arcebispo Frei Baltazar Limpo, de relíquias do Santo (pequenos ossos que análises realizadas apontam ter pertencido a uma criança com cerca de 12 anos). O corpo, se alguma vez existiu, teria já desaparecido.

Muito devoto do seu Santo, a vila de Rates colocou-se sob o seu cuidado. Nos limites definidos pelo caminho do cerco ele vela para que nem fome, nem peste, nem a guerra toquem nos seus protegidos. Para tal pode contar com o apoio de S. Sebastião, que é igualmente celebrado pela paróquia, a 20 de Janeiro.

Invocado para muitas graças, S. Pedro de Rates é, no entanto, associado à esterilidade. De uma antiga fonte com o seu nome diz-se que se poderia obter a cura da enfermidade, cumprindo o seguinte ritual: a mulher deveria sentar-se sobre uma pedra furada que aí existia. Talvez por ser mercê tão divina, tem o Santo fama de vingativo para com quem não cumpre o prometido. É, provavelmente por receio desse “humor”, que muitas mulheres grávidas guardam o dia do Santo – 26 de Abril – e até para os animais fêmeas no mesmo estado não é aconselhável a utilização nos trabalhos. Qual a base histórica desta lenda? A desmontagem pode fazer-se logo ao primeiro nível: são grandes as dúvidas sobre a peregrinação de S. Tiago à Península. Logo depois prova-se que a evangelização de Braga é posterior a meados do século I. Por outro lado, este culto não consta em nenhum dos numerosos livros litúrgicos bracarenses anteriores a 1511. A história aparece pela primeira vez nesta altura, num breviário e missal publicado pelo arcebispo de Braga D. Diogo de Sousa.

Será que não existem fundamentos reais para toda esta lenda fabulosa? A análise do contexto em que ela surge poderá fornecer alguma pista? No século XVI, a diocese de Braga continuava a sua querela com Toledo sobre a primazia ibérica, daí a “grande preocupação em canonizar S. Pedro de Rates, que era identificado como primeiro bispo bracarense e sagrado por S. Tiago Apóstolo. Deste modo queria provar que a Igreja Bracarense vinha do tempo apostólico. Para isso, forjou-se a descoberta do seu corpo pelo eremita e um célebre Dr. Lousada fabricou diversos documentos falsos, como sendo de séculos anterior.” (1)



Então tudo isto foi inventado do nada? Existiu algum Santo com ligações à vila de Rates? É ao P.e Avelino de Jesus Costa que se deve o esclarecimento deste imbróglio. De facto existiu um Pedro, bispo de Braga, que morreu em Rates. Este seria não o primeiro eleito para a cátedra bracarense mas sim o restaurador da diocese, aquando da reconquista cristã. A coincidência do nome possibilitava a confusão. O Bispo D. Pedro (1070-1091), o restaurador, morreu com fama de santidade num mosteiro dos limites da sua diocese. Esse mosteiro seria, muito provavelmente, o de Rates.

Um Abraço Galaico!

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