sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Literatura a seguir durante a Senda de 6 de Março

ARTE MEGALÍTICA NO PLANALTO DE CASTRO LABOREIRO

(MELGAÇO, PORTUGAL)

António Martinho Baptista

Centro Nacional de Arte Rupestre. Vilanova de Foz Côa


Em Abril de 1990, na sequência de uma violação recente, detectámos a presença

de gravuras e restos de pinturas na Mota Grande, a maior mamoa do planalto

de Castro Laboreiro. Tendo em atenção a importância do achado e no sentido

de salvaguardar futuros vandalismos no monumento, realizámos de imediato o

levantamento das gravuras dos dois esteios decorados que foi possível

identificar. Posteriormente e porque o monumento, embora se localize em plena

linha de fronteira, está já na mancha galega do planalto, comunicámos estes

achados aos responsáveis do Património Histórico da Galiza. Por não

considerarmos este levantamento como um trabalho acabado, nunca o

publicámos. No entanto e talvez na sequência do nosso alerta, o Boletín

Avriense revelou a presença da arte megalítica na Mota Grande através de um

pequeno artigo, com um desenho sumário e imperfeito dos motivos.

Entretanto, o Parque Nacional da Peneda-Gerês, por protocolo com a Sociedade

Portuguesa de Antropologia e Etnologia, iniciou o estudo arqueológico do

megalitismo do planalto de Castro Laboreiro, tendo-se começado as escavações

a partir de 1992, com uma equipa constituída por Vítor Oliveira Jorge (a quem

foi entregue a coordenação científica do projecto), Eduardo Jorge Lopes da

Silva, Susana Oliveira Jorge e nós próprios. Entre 1992 e 1994, foram realizadas

três campanhas de escavações em monumentos situados na Portela do Pau, a

mais de 1 200 metros de altitude, em mamoas integradas no mesmo conjunto da

Mota Grande. Desde o início, quer o PNPG, quer a SPAE, procuraram alargar

o âmbito desta investigação a colegas da Galiza, facto que nunca foi possível.

Por outro lado, durante esse tempo, o PNPG disponibilizou verbas vultuosas

para esta investigação (“Castro Laboreiro, uma arqueologia da Paisagem”, assim

se chamava o projecto), que culminariam com a criação de um Museu de

Freguesia em Castro Laboreiro e de um “parque temático megalítico” no

planalto. Infelizmente, por razões várias, os trabalhos arqueológicos no planalto

foram suspensos a partir de 1995, tendo entretanto também a mudança de gestão

no PNPG em 1996 conduzido a uma alteração da política arqueológica do

próprio PNPG, desde então completamente paralizado no que à arqueologia diz

respeito.

Durante as campanhas de 1993-1994 foram descobertos novos restos de arte

megalítica noutros dos tumulus da Portela do Pau, a mamoa 2, descoberta que

decorreu fruto da escavação. Conhecem-se assim no grupo de mamoas da

Portela do Pau dois dólmens decorados, havendo possibilidades de trabalhos

futuros poderem detectar novos restos artísticos. Também o levantamento

arqueológico da arte megalítica desta mamoa 2, devido ao tipo de vestígios que

ostenta e à interrupção dos trabalhos em 1995, nunca foi convenientemente

terminado, sendo passível de pequenos acertos no futuro.

Pese embora estes factores, são esses dois levantamentos “quase completos” que

trazemos à apreciação deste Colóquio.

A Mota Grande é a mais imponente mamoa do planalto de Castro Laboreiro. A

ela devia estar associado um menir que detectámos junto à sua base, removido

muito provavelmente pelos trabalhos de uma estrada que segue a linha de

fronteira. Na sequência dos alertas que lançámos junto das autoridades da

Galiza, este monumento, profundamente violado em meados dos anos 80, seria

parcialmente escavado e consolidado por uma equipa galega no verão de 1995.

Na altura, por deferência dos colegas galegos, acompanhámos estes trabalhos,

que se limitaram a uma melhor definição e desenho da estrutura da câmara e a

uma limpeza e leitura dos cortes e perfis deixados pelos violadores na mamoa.

Não tendo sido possível outro tipo de colaboração, não tivemos oportunidade de

corrigir o levantamento inicial das gravuras, que é o que agora apresentamos.

A câmara megalítica é de planta poligonal, tendo, pelo menos, dois dos seus

esteios gravados, respectivamente o primeiro e segundo esteios à esquerda da

pedra de cabeceira. A decoração é constituída pela habitual temática da arte

atlãntica megalítica, destacando-se uma representação de tipo “idoliforme”,

gravada em baixo-relevo, presumivelmente também com restos de pintura a

vermelho, rodeada de figuras meândricas. O motivo “idoliforme” está

aparentemente centrado no esteio, formando com a restante decoração uma

composição de carácter abstracto.

O segundo esteio citado, à esquerda do anterior, ostenta igualmente uma

composição centrada num conjunto de quatro círculos concêntricos rodeados por

linhas meandricas e quebradas. Por não termos efectuado qualquer escavação

neste dólmen, não foi possível determinar exactamente a base da composição.

Deve ressalvar-se o particularismo técnico dos gravadores que se terão

apercebido, talvez durante a operação de talhe do esteio, da presença de um

manto de pegmatites róseas na composição do granito. A superfície amarelada

do granito ligeiramente picotada deixava aparecer a camada rósea de pegmatite,

criando uma ilusão pictórica muito idêntica a uma pintura a ocre.

Relativamente à decoração do dólmen da mamoa 2 da Portela do Pau, ela é

quase inteiramente gravada, ostentando embora também restos de pintura a

negro. Aqui, após o restauro da cãmara megalítica (também ela de planta

poligonal e corredor indiferenciado) que se limitou à reposição dos sete esteios

ainda existentes “in loco” nas suas camas originais, foram identificadas

decorações em seis desses esteios. Apenas o primeiro esteio à direita não tinha

qualquer decoração. Esta é quase inteiramente formada por faixas ritmadas de

linhas quebradas, destacando-se a do esteio de cabeceira, a mais compósita, que,

quer pela formulação decorativa, quer pela própria forma do esteio, lembra uma

enorme placa de xisto! Por outro lado, a decoração deste dólmen, tem, ela

própria, alguns particularismos que importa destacar. Assim, ao contrário da

Mota Grande, o ordenamento decorativo é compósito e deve ser encarado como

um todo, não devendo isolar-se a sua temática que é aparentemente realizada

num único momento. As gravuras são finíssimas, muitas delas quase

imperceptíveis. Os restos de tintas negras em alguns sectores de pelo menos dois

esteios, levam-nos a considerar poderem estes ter sido inicialmente cobertos

integralmente por uma tinta negra e as gravações finamente realizadas sobre essa

tintagem negra. Esta tinta apareceria como um preparado. As datações absolutas

a partir de amostras de carvões, atribuíveis ao momento de “condenação” da

cãmara deram cronologias da primeira metade do IV milénio a.C. De acordo

com a hipótese interpretativa apresentada por Vítor Oliveira Jorge na publicação

destas datações (1996), a mamoa 2 teria sido construída “durante a segunda

metade do Vº milénio a.C.” É a este momento que deve ser atribuído o seu

“projecto decorativo”, que deve ser encarado como uma obra total, realizado

num único momento.

A decoração da Mota Grande, integrada no mesmo conjunto de mamoas, deve

ser atribuída “sensu latu” ao mesmo período cronológico.

Um Abraço Galaico!

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